Imagem Edifício Guinle
Imagem da fachada do Edifício Guinle no centro da cidade de São Paulo

Edifício Guinle: O Marco Inicial da Verticalização de São Paulo

O primeiro grande edifício de São Paulo foi inaugurado em 1913 e logo se tornou uma verdadeira joia da arquitetura paulistana no estilo art nouveau, que marcou a história pelo pioneirismo no uso de concreto armado no Brasil.

Transformação urbana: A renovação da arquitetura paulistana


No início dos anos 1900, a cidade de São Paulo havia se transformado em um intenso canteiro de obras, em razão dos alargamentos e retificações, da até então arcaica estrutura viária paulistana, para adequá-la ao crescente tráfego de bondes e automóveis que vinha ocorrendo na época.

Além disso, havia também a vontade de erradicar os velhos traços da arquitetura luso-brasileira dos tempos de colônia e império, que invariavelmente resistiam nas ruas mais importantes daquela que se tornava a metrópole do café.

Alinhada a este objetivo, a prefeitura de São Paulo realizava inúmeros esforços para promover a renovação da cidade com a paisagem urbana que a elite paulistana europeizada da época sonhava em compor para a pujante capital do estado.

Dentre eles, se destacava o incentivo às pessoas que erguessem edifícios de três ou mais pavimentos em determinadas ruas do centro, alinhados às diretrizes arquitetônicas sugeridas pelo novo padrão estético planejado para a cidade.

Como estímulo adicional chegou-se a criar prêmios de arquitetura para premiar os proprietários das edificações mais bem elaboradas que contribuíam com a nova imagem desejada para São Paulo.

Do projeto à construção: Um símbolo da verticalização paulistana


Projetado pelos engenheiros Hipólito Gustavo Pujol Júnior e Augusto de Toledo, a pedido dos Guinle, uma rica e tradicional família da elite carioca para ser a sede paulistana de suas empresas, o Edifício Guinle acabou se tornando o precursor dos arranha-céus e marcando uma nova era na arquitetura de São Paulo.

Foi o engenheiro Sá Rocha, técnico responsável pela repartição de obras da cidade de São Paulo na época que, em setembro de 1912, analisou o projeto de um edifício de “cimento armado”, com oito pavimentos, a ser construído na Rua Direita, n° 7 A, que atualmente é o n° 49.

O prédio teria 32 metros de altura e isso significava o dobro da altura dos prédios em seu entorno, que eram construções de tijolos com três pavimentos, erguidas a partir dos anos 1890.

Naquele tempo, as construções mais notáveis eram:

  • Casa Martinico, situada na Praça Antônio Prado, que era um edifício de escritórios que substituiu a velha Igreja do Rosário;

  • Edifício João Brícola, localizado também na Praça Antônio Prado, no ponto de fuga da perspectiva da futura Avenida São João;

  • Casa Barão de Iguape, localizada na Rua São Bento, entre as Ruas Direita e Quitanda.


Contra o projeto do Edifício Guinle em si o engenheiro nada tinha a alegar, já que estava de acordo com as exigências legais. A única questão era quanto à altura do prédio que iria sair fora dos padrões das construções daquela época e gerar um preponderante contraste visual no centro da cidade.

A comissão de obras da câmara municipal aproveitou o caso e propôs uma nova regra para determinar a altura de novas edificações em São Paulo, que não deveria exceder duas vezes e meia a largura da via no ponto em que seriam construídas. O que no caso do Edifício Guinle resultava em 28,60 metros de altura, já que a sua via possuía 11,45 metros de largura, em média.

A nova regra havia sido baseada nos dados de uma pesquisa realizada por representantes da prefeitura de São Paulo nas cidades de Paris e Buenos, que aprovavam novas edificações com até 30 metros de altura, e também nas principais cidades norte-americanas que em geral admitiam prédios com altura de até 70 metros.

A solução proposta, no entanto, não foi plenamente aceita pela comissão de justiça de São Paulo, que acabou autorizando a construção do Edifício Guinle por meio da Resolução n° 32, de 23 de novembro de 1912, com seus 32 metros de altura, previstos originalmente no projeto.

Conta a história que uma visita do eminente engenheiro Antônio Francisco de Paula Sousa, então diretor da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, ao prefeito Barão de Duprat, convencendo-o da estabilidade da futura edificação, foi decisiva para a permissão oficial para a construção do Edifício Guinle.

Desta forma a obra foi executada e se tornou a mais alta edificação da cidade de São Paulo, e até hoje reina absoluto muitos metros acima dos prédios vizinhos, que são ainda, praticamente os mesmos existentes em 1912.

Obra vanguardista: Um legado de inovação para a arquitetura paulistana


Hipólito Gustavo Pujol Júnior, um dos arquitetos do projeto, formado pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, desempenhou um relevante papel na introdução da técnica do concreto armado em construções paulistanas.

Já que em 1907, publicou o que talvez tenha sido o primeiro estudo sobre a tecnologia do concreto armado realizado no Brasil. E apenas dois anos mais tarde, passou a lecionar disciplinas ligadas à área.

Além disso, seu projeto, o Edifício Guinle, que iniciou sua obra em 1912, sendo inaugurado em 1913, porém sendo finalizado apenas em 1916, foi a primeira construção acompanhada de perto por técnicos do Laboratório de Ensaios da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo.

Outro diferencial desta obra foi que o concreto usado passou por testes no Gabinete de Resistência dos Materiais da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, hoje conhecido como IPT – Instituto de Pesquisas Tecnológicas, vinculado ao Governo do Estado de São Paulo, para garantir a segurança da inovadora construção na época.

Para a execução da obra foram utilizadas vigas vencendo vãos de 12 metros de extensão, uma inovação para a época, que Hipólito Gustavo Pujol Júnior testava em experiências conduzidas por ele em seu laboratório.

Embora o projeto do Edifício Guinle tenha sido aprovado com uma altura inicial de 32 metros, correspondentes a oito pavimentos, a estrutura acabou por receber, durante sua execução, o acréscimo de duas edículas situadas acima do nível da cobertura do ático, elevando sua altura final para algo em torno de 36 metros.

Características do edifício: Uma obra de arte inspirada pelo movimento Art Nouveau


Embora o Art Nouveau não seja tão dominante na paisagem urbana de São Paulo como outros estilos arquitetônicos, suas contribuições são notáveis e adicionam uma fascinante camada à rica história da arquitetura da cidade.


O estilo Art Nouveau, que floresceu entre o final do século 20 e o início do século 21, deixou sua marca na arquitetura de São Paulo por meio de suas linhas curvas, ornamentos naturais, vitrais coloridos, ferro forjado e assimetria fluída que se integravam harmoniosamente com o ambiente ao redor, proporcionando uma nova estética para os edifícios da época.

Os arquitetos daquele tempo buscavam caracterizar as edificações como Art Nouveau por formas elegantes destacadas principalmente pelos detalhes em suas fachadas, que representam uma época de transição na arquitetura da capital, marcada pela influência das tendências europeias e pela busca de uma estética mais ornamentada.

Aqui estão algumas das características notáveis do estilo Art Nouveau na arquitetura de São Paulo durante o século 21, que contribuíram para a riqueza e a diversidade da paisagem urbana da cidade:

  • Linhas Curvas: Uso de linhas orgânicas delicadas criando uma sensação de movimento.

  • Ornamentos Naturais: Motivos florais e demais formas inspiradas na natureza incorporadas na decoração e ornamentação dos edifícios.

  • Vitrais Coloridos: Uso de vitrais decorativos promovendo uma interação entre luz e cor para criar efeitos impressionantes.

  • Ferro Forjado: Elementos de ferro forjado para criar detalhes ornamentais decorativos como grades, corrimãos e demais enfeites.

  • Assimetria Fluída: Abordagem assimétrica na composição, dando uma sensação dinâmica de fluidez.

  • Integração com o Entorno: União harmoniosamente das edificações com o ambiente ao redor, incorporando elementos e respeitando características locais.

  • Originalidade Incentivada: Valorização da originalidade e da expressão individual encorajando os arquitetos a criar designs únicos e inovadores.


O estilo arquitetônico Art Nouveau do Edifício Guinle fica evidente por suas aberturas bastante largas para os padrões da época e uma fachada com granito rugoso e argamassa pigmentada na cor ocre.

Assim como também pelas peças de bossagem rústicas, que são aquelas que sobressaem do prumo, e a argamassa lisa no térreo.

É possível destacar ainda, além de tudo, as portas de chapa ondulada metálica com gradil de ferro e suas esquadrias de madeira e vidro espalhadas majestosamente por sua estrutura de concreto.

Um detalhe que chama chama a atenção na fachada do prédio são as duas hastes com asas e serpentes enroladas, atribuídos ao símbolo da medicina, mas que no caso do Edifício Guinle representavam o Caduceu de Hermes, pois na mitologia grega Hermes era o deus do comércio, que foi a atividade inicial que proporcionou o início da fortuna da família Guinle.

Restauração urbana: tombamento de patrimônio arquitetônico


Em 1997 o Edifício Guinle foi comprado pela Mundial Calçados, que é uma uma rede de 18 lojas distribuídas por São Paulo e uma das 50 marcas mais fortes do Brasil, segundo a Superbrands.

Mas foi apenas em 2009 que a Mundial Calçados apresentou para a prefeitura de São Paulo um projeto de restauração do prédio com o objetivo de retomar suas características originais.

Após a aprovação do projeto em 2010 o CONPRESP (Conselho Municipal de Preservação do Patrimônio Histórico, Cultural e Ambiental de São Paulo) realizou o tombamento do imóvel como patrimônio da arquitetura da cidade de São Paulo.

Foi então que a instituição Companhia do Restauro foi contratada para realizar a obra de restauração do Edifício Guinle, que levou inicialmente um ano para planejar todo o processo de restauração do prédio antes de começar a execução da reforma.

Por ser um edifício tombado foi necessária uma aprovação técnica por parte do CONPRESP, que exigiu que se mantivesse ao máximo as características originais do prédio, como seu telhado de cerâmica, seus elementos decorativos metálicos na cor grafite, sua fundição dos trincos das janelas entre outros detalhes.

Em fevereiro de 2011, deu-se início a tão aguardada restauração do Edifício Guinle, com uma equipe de 25 pessoas que executou fielmente a obra.

O custo do projeto de restauração do Edifício Guinle de R$ 700 mil foi bancado pela Mundial Calçados com o apoio da Lei Cidade Limpa, que permitiu a instalação de um outdoor com publicidade da empresa na fachada do prédio, por meio da aprovação do departamento de patrimônio histórico da prefeitura de São Paulo.

Este foi o primeiro projeto a utilizar o artigo 50 da Lei Cidade Limpa de São Paulo, o qual concede o uso de publicidade como meio para financiar restaurações de imóveis históricos.

Atualmente o Edifício Guinle é utilizado como escritório e estoque da empresa Mundial Calçados, além de uma loja aberta ao público no pavimento térreo do prédio.

Patrimônio histórico: Um ícone resiliente da arquitetura paulistana


O Edifício Guinle não é apenas um marco arquitetônico, mas também um símbolo de resiliência e progresso para a cidade de São Paulo.

Sua presença majestosa desde o início do século 20 no skyline da cidade é um lembrete constante da evolução de uma cidade horizontalizada para uma metrópole verticalizada.

Este ícone da arquitetura paulistana ressalta a importância de preservar o patrimônio e celebrar a história desta cidade que se tornou a mais rica da América Latina, a maior do Hemisfério Sul e uma das mais importantes do mundo.

A Redação do Planeta SP é composta por uma equipe de profissionais especialistas dedicados a facilitar o dia a dia da população paulistana e contribuir para fazer de São Paulo uma cidade cada vez melhor para se viver.